segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

No Sabor nascem vias-rápidas e a posta ficou por Sabor(ear)

Aqui bem perto do Distrito da Guarda está a nascer mais uma grande barragem, junto à foz do Rio Sabor.

Rio Sabor nasce junto à fronteira entre Portugal e Espanha, na Serra de Montesinho/Gamoeda, e desagua junto a Torre de Moncorvo e Pocinho, no rio Douro, na povoação de Foz do Sabor.

Se é necessária ou se vai servir apenas para encher mais os bolsos de ex-governantes e de capitalistas chineses...é discussão do passado, pois está pronta e a começar a encher, ajudada pelas abundantes chuvas deste Inverno.

Tornou-se por isso urgente visitar o local, já agredido pelo paredão da barragem, mas ainda quase sem água armazenada.

Aproveitando um fim-de-semana sem outros programas, desafiei alguns companheiros do pedal para ir conhecer o vale do Sabor, num percurso por estrada.. O estado do tempo quase fez anular a visita, mas à ultima hora as previsões apontavam 12 horas sem chuva, precisamente no dia previamente marcado.

O percurso, a percorrer no sentido horário.
Arrancámos da Guarda, ainda o dia a nascer, com muito frio e alguma chuva. Começamos as pedaladas precisamente na aldeia de Foz do Sabor, com a água do Sabor quase a tocar no tabuleiro da ponte que lhe dá acesso. O tempo estava muito nublado, mas não parecia ameaçar chuva.

A partida na aldeia de Foz do Sabor
Muitas tangerinas para apanhar. Este é um vale muito fértil!
Local onde o Sabor se junta ao Douro. O Sabor vem da esquerda e o Douro corre lá do fundo, após passar a Barragem do Pocinho.
O primeiros 5 km eram planos, paralelos ao Sabor, até se atravessar a Ribeira da Vilariça e a N102. O ideal para aquecer os músculos e apreciar a paisagem plana, coisa rara por estes lados!

A paisagem junto à Foz do Sabor, zona muito fértil, com calor e água com fartura.
Um Coelho a fugir!
Lá vai ele!
Depois era preciso vencer a primeira grande subida do dia, quase até à aldeia de Estevais. Durante a subida podemos ver já os efeitos da subida das águas provocada pelo 2.º escalão da barragem, que fica mesmo junto à Foz. A ponte antiga da N102 já estava praticamente submersa.

A nova ponte da N102. Ainda é possível ver vestígios da antiga.
Apontando mais para a esquerda, lá vai o Sabor já transformado em Albufeira.

A vista após muitas curvas e contracurvas da sinuosa e bela M611

Num miradouro, com vista para o vale da Ribeira da Vilariça.
Já por terrenos mais planos, foi possível aumentar a média e passar por Estevais, Cardanha e Gouveia. Aqui havia a opção de virar à esquerda e seguir já para Alfandega da Fé ou virar à direita para ver as vistas sobre o Sabor. Apesar do mau piso da estrada, virámos à direita, onde passado pouco tempos encontrámos o escalão principal da barragem, que vai dar origem a uma mega-albufeira com 60 km de extensão.

A paisagem agredida pelas obras da Barragem. Em breve vai ser um lago enorme.
Durante algum tempo pedalamos junto ao vale do Sabor, que de tão fundo poucas vezes deixava ver o rio. Passámos pelas aldeias de Cabreira, Picões, Ferradosa e Sendim da Serra.

Monte, montes e mais montes.
O piso exigia atenção para evitar furos ou avarias piores.


Felizmente o presidente da câmara lembrou-se de nós e arranjou este tapete!
Monte, montes e mais montes. O Sol começa a espreitar lá ao fundo.

Com pouco mais de 40 km chegámos a Alfandega da Fé. A distância ainda era pouca, mas as subidas já faziam estragos. Paragem num café, onde ninguém queria comer, come-se uma barra para não perder mais tempo, mas afinal todos aconchegaram a barriga. E com o que veio a seguir, ninguém se arrependeu.

A saída de Alfandega da Fé seria a descer até à Ribeira de Escaria, pela N215 e depois N315. Até ao nó de ligação do IC5 o piso era bom, mas depois disso estava destruído, possivelmente pela passagem dos camiões que estão a construir uma nova ponte sobre a Ribeira de Escaria, que também vai ser afectada pela barragem. 

Logo na primeira curva com mau piso uma máquina de filmar é triturada. Um dos companheiros trazia uma máquina de filmar presa ao quadro da bicicleta, com a vibração no mau piso o suporte rodou e a máquina foi apanhada pelos raios da roda de trás. Por sorte não se magoou, mas perdemos vários minutos a apanhar os destroços, a procurar o cartão de memória e a endireitar a roda que ficou bem empenada.

Com cuidado fizemos o resto da descida, até encontrar finalmente a Ribeira de Escaria, onde a nova ponte está quase concluída.

A Ribeira de Escaria, com a nova ponte quase concluída. A ponte antiga está escondida lá atrás pelo tabuleiro da nova. A outra ponde lá atrás é do IC5.
A vista por cima da ponte antiga. 
Falei aqui do IC5? Que veio trazer o progresso e desenvolvimento a toda esta região? Ou a isolar ainda mais os seus habitantes?

Mas antes disso, todo o ciclista sabe que depois de atravessar um curso de água é preciso subir. Foi o que nos esperou, numa subida inclinada e onde o mau piso tornava tudo mais difícil. Para piorar as coisas, começou a chover, primeiro pouco, mas no final da subida fomos recebidos por um diluvio acompanhado de ventos fortes, que faziam as gotas da chuva parecer agulhas.

Junto à aldeia de Sardão a N315 iria juntar-se ao IC5 durante alguns quilómetros, na passagem do Rio Sabor. Nos mapas mais antigos essa passagem do Rio Sabor pertencia à N315, mas com a conclusão das obras do IC5 as estradas unificaram-se entre o nó de Sardão e Meirinhos.

O IC5 é uma via reservada a automóveis, onde as bicicletas não podem circular. Mas existem outras situações de IC e IP onde na passagem de pontes é permitida a passagem de veículos não automóveis, por não existirem outras alternativas para esse tipo de veículos ou para peões.

Infelizmente não é o caso do IC5, onde populações de aldeias que estão praticamente à vista umas das outras, estão separadas por 70 quilómetros de distância, caso queiram cumprir a lei e não tenham um automóvel, como acontece com muitos dos habitantes idosos desta região. Quem tem terrenos agrícolas nas 2 margens do rio também não tem como passar um tractor de um lado para o outro.

Logo que chegámos ao IC5 um funcionário da Ascendi avisou-nos que não podíamos aí circular. Perguntámos por alternativas, ele disse que não havia, teríamos que voltar para Alfandega da Fé.

Molhados até aos ossos e com a Ribeira do Escaria pelo meio, voltar para trás não era opção. Logo após a ponte sobre o Rio Sabor havia um acesso para uma aldeia, São Pedro. Dessa aldeia há uma estrada para Meirinhos, onde a N315 já está separada do IC5. Seriam apenas 3 km no IC5, sempre a descer, numa zona onde o limite de velocidade é 60 km/h e onde só passa um carro de minuto a minuto.

Rapidamente fizemos a descida até ao acesso a São Pedro, onde encontrámos até à aldeia um alcatrão novo em folha. Mas afinal a estrada que ligava São Pedro a Meirinhos era um caminho escabroso em terra batida, com muita pedra à mistura. Com as bicicletas de estrada teria de ser feito a pé, seriam cerca de 5 km.

Voltar para o IC5 significa fazer vários quilómetros nessa estrada, por uma grande subida, quer para um lado, quer para o outro. Ir a pé pelo caminho de terra batida iria demorar mais de uma hora. A solução foi pedir boleia a um simpático casal que ia para Meirinhos, onde seria possível apanhar um táxi e ir buscar os carros à Foz do Sabor.

Fiquei com outros 4 companheiros em S. Pedro à espera dos 2 que foram de táxi buscar o carro. Fomos à procura do forno comunitário, onde havia alguma lenha para acender uma lareira e tentar secar as roupas encharcadas.

A lareira a começar a deitar algum calor (e muito fumo).
Após algum desconfiança inicial, provocada pela invasão daqueles seres de bicicleta, capacete e roupas coloridas, os habitantes locais lá meteram conversa connosco. Passado pouco tempo já nos tinham oferecido pão, presunto, vários tipos de chouriço, azeitonas e um jarro de vinho caseiro! Quentes, de barriga cheia e com quem conversar sobre a vida em S. Pedro, a espera pelo resgate foi curta!

Pão, presunto, chouriços, azeitonas e vinho. O povo português  é mesmo hospitaleiro!


Além de conhecer o Sabor ainda selvagem, iríamos aproveitar esta volta para almoçar em Carviçais, freguesia de Torre de Moncorvo, famosa pelo seu festival de rock e pela Posta à Mirandesa servida nos restaurantes locais. A Posta à Mirandesa ficou por Sabor(ear), mas está prometido novo passeio por estes lados, com paragem obrigatória em Carviçais.

Ficámos também a conhecer as gentes simpáticas de S. Pedro, que apesar de terem uma via rápida versão PPP-Socrática à porta de casa, que custou e vai custar ainda muitos milhões, vivem isolados das aldeias vizinhas. Um desenvolvimento feito a pensar nos negócios de milhões, decidido nos escritórios de grandes empresas, mas que esquece os problemas das pessoas que se poderiam resolver com tostões.

Leia aqui outro relato do mesmo passeio: http://bikevassourateam.blogspot.pt/2014/02/giro-no-pedal-reconday-volta-da-posta.html

Nota acrescentada a 12-02-2014:
Sobre a utilização do IC5 por veículos não automóveis (bicicletas, tractores, ciclomotores, peões) na zona sem outras alternativas junto ao Rio Sabor, hoje ligaram-me da Câmara Municipal de Alfandega da Fé. A câmara e as juntas da zona estão a fazer pressão junto das Estradas de Portugal para que o IC5 seja aberto a todos. O problema é que é uma estrada concessionada à ASCENDI e terá de haver uma alteração ao contracto efectuado entre o Estado e essa empresa.
Mas esperam que o problema seja resolvido à mesma.
Mas quem quiser reclamar junto das Estradas de Portugal só irá ajudar, fazendo pressão para que as coisas mudem.

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